O agronegócio, hoje, é guiado por gestores em que sua maioria são homens de 46,5 anos de idade, ainda que com crescente participação feminina, e que estão envolvidos com novas tecnologias, mídias, fontes de informações e compra e venda de insumos. São gestores centralizadores, que no decorrer de sua vida buscaram instituir seu patrimônio e constituir sua família em ambiente urbano, conforme dados da ABMRA (Associação Brasileira de Marketing Rural e Agronegócio). Nesse cenário, acabam por coexistirem pensamentos de 3 gerações diferentes, pais, filhos e netos, e conciliar essa diversidade para planejar o futuro é uma tarefa desafiadora.
As famílias do agronegócio, portanto, constituídas como empresas familiares, detêm 96% dessa fatia, logo, é importante que se discuta como se dará a continuidade da atividade rural empresarial, desenvolvida no seio familiar, se por ventura vier a faltar esse gestor. Planejar demonstra-se primordial, não só para o futuro de todos os herdeiros, mas como também na manutenção da atividade produtiva desta terra.
A partir do entendimento dos desejos do patriarca, juntamente com uma análise do genoma da família, é possível traçar os primeiros passos para que se inicie o processo, dialogando com todos os familiares envolvidos. Isso porque ao se realizar um plano de sucessão, são diversos aspectos legais, familiares, e tributários que devem ser observados, uma vez que os atuantes na linha sucessória devem estar cientes de suas responsabilidades para que a continuidade da atividade seja preservada.
São diversas as formas em que se pode efetivar a transmissão. A exemplo, é possível que as questões sejam suprimidas a partir de um testamento, como também através da criação de sociedades rurais. É sabido que, por questões culturais, há uma grande resistência em se efetivar mudanças, dividir decisões, e pensar na profissionalização do negócio, porém, dependendo da estruturação da família, a criação de uma sociedade entre os herdeiros torna-se, muitas vezes, uma das melhores ferramentas de custo-benefício para manter a operação com aquele herdeiro que já detém as características e habilidades para a função de gestão da atividade, sem deixar de privilegiar com participação de lucro e atividades secundárias os demais herdeiros.
De outra banda, as questões corporativas e de governança também são trabalhadas dentro da sucessão. Através de ferramentas contratuais, como acordo de sócios e protocolo familiar, são dispostas as vontades das partes, e firmadas as suas obrigações. Ao gestor, patriarca da família, fica a manutenção da administração das atividades, bem como o encargo de gerir a sucessão planejada. Com o passar do tempo e os enigmas da vida, podem haver mudanças na estruturação da sucessão, como a surpresa de uma separação, de um filho fora do casamento, ou de qualquer outra situação familiar. Esses fatos não podem interferir no fluxo de atividades empresariais, devendo estar previstos contratualmente mecanismos de mitigação de riscos, com cláusulas adequadas para que não se engesse a operação e se proteja a família.
Porém, a partir da criação de uma empresa, toda a operação passa a ser realizada de forma empresarial, e não sob a pessoa física, como geralmente ocorre. É importante que se diga que esse procedimento não é uma receita de bolo, podendo ser utilizada em larga escala. Para cada uma das famílias e, porque não, das atividades, deve preceder um estudo de viabilidade técnica, em que se analisarão os pontos positivos e negativos para que se constitua o escopo esperado. Muitas vezes, mostra-se mais vantajoso para o negócio familiar que parte da operação seja efetivada por meio da pessoa física – produtor rural –, e outra parte seja redirecionada para uma pessoa jurídica.
Diante disso, percebe-se uma forte tendência que a gestão rural sofra cada vez mais processos de profissionalização em sua atuação, independentemente do seu tipo. O resultado esperado e já visto em muitas famílias, é a perpetuação da atividade rural como não mais “negócio do pai”, mas agora como “negócio da família”, e cujo centro de obrigações e deveres possa a ser compartilhado pelos herdeiros, conforme suas preferências. Acaba-se por entender o imóvel rural como um empreendimento, e com maior possibilidade de sustentabilidade do negócio ao longo das gerações.
Esse texto também foi publicado no Jornal Popular, edição 1.601, de 6 de maio de 2021.